quinta-feira, 15 de agosto de 2013

O espião que foi para o frio - artigo

Hércules Rodrigues de Oliveira - Professor da Novo Horizontes.

 Edward Snowden


Agora que o ex-técnico dos serviços de inteligência dos Estados Unidos (EUA) Edward Snowden conseguiu asilo político na Rússia, encerra-se um drama, para que se dê  início a uma nova história a ser assistida em outro filme do polêmico Oliver Stone, tido, por muitos, como um teórico da conspiração.

Snowden diferentemente do personagem de John Le Carré, é um espião que, ao invés de sair, foi para o frio, buscar o calor da proteção de um estado nacional à altura da América, pois a China não se sentia confortável, por enquanto, em afrontar o Tio Sam, apesar de ser um dos seus principais rivais geopolíticos. Entretanto, Vladimir Putin, ex-chefe do extinto Serviço Secreto Soviético (KGB) e do seu sucessor FSB (Serviço Federal de Segurança), sempre soube da importância de se ter como aliado, um dissidente detentor de conhecimentos sensíveis de seu arquirrival. Putin leva para a nova ordem, as brumas da "Guerra Fria", que já se fazem presentes no pesadelo da Síria de Bashar al-Assad.

Snowden representa um capítulo da novela que iniciou-se com a divulgação de mais de 700 mil documentos confidenciais da diplomacia e das Forças Armadas dos EUA, pelo soldado Bradley Manning, em  2010, publicadas no site Wikileaks, cujo editor-chefe, Julian Assange, encontra-se exilado na Embaixada do Equador, em Londres, desde o dia 19 de junho de 2012. Manning recebeu de uma corte militar a condenação por crimes de espionagem. Sem pena definida, ele pode chegar a superar 130 anos de prisão.

O vazamento de informações envolvendo estes três atores, Assange, Manning e Snowden, não é o primeiro e nem será o último a ocorrer nos EUA. Grosso modo pode-se inferir que a música de David Bowie "This is not América" (Esta não é a América) pode ter de algum modo os influenciado, pois aquela não é a América que eles esperavam e que lhes foi dito que fosse, ou seja, uma nação democrática que respeitasse o direito e a soberania dos povos. Desiludiram-se pela política hipócrita do governo estadunidense frente até mesmo aos seus aliados, como se viu, em 1975, quando o jovem de classe média Christopher Boyce, funcionário de uma empresa de segurança que prestava trabalhos para a Central de Inteligência Americana (CIA), entregou aos soviéticos, os planos para desestabilizar o governo do primeiro ministro australiano Gough Whitlam, bem como a participação da CIA no golpe para derrubar o governo Allende no Chile, em 1973.

Uma breve leitura nos artigos da Revista História Viva, veremos que a CIA conspirou para derrubar Getúlio Vargas. O adido militar da embaixada dos EUA, general Vernon Walters contribui para a deposição de João Goulart. O Sistema de Vigilância da Amazônia (Sivam) foi entregue à Raytheon, empresa que presta serviços ao Departamento de Defesa dos EUA que passou a conhecer o espaço aéreo, o solo e subsolo da Amazônia brasileira.

As revelações tanto de Manning quanto de Snowden, nos remete, querendo ou não, ao conto de fadas do dinamarquês Hans Christian Andersen, publicado em 1837, intitulado: A roupa nova do rei. Todos viam que não havia roupa exuberante vestindo o rei, mas coube a apenas uma criança desmascarar a farsa ao gritar: "O rei está nu!".

Que nação no mundo hodierno pensa não ser alvo de interesses alheios? Alvin Toffler dizia: "Ou você tem uma estratégia própria ou então você é parte da estratégia de alguém". Os espiados fingem surpresa e indignação. O Brasil, particularmente, quer cobrar explicações, entre outras, do governo americano sobre as invasões das mensagens eletrônicas. Deveria cobrar também sobre a atuação dos Serviços Secretos da França, da Inglaterra da Rússia e de Israel, atuando em território nacional.

As autoridades brasileiras já tinham conhecimento, em 2001, da capacidade dos EUA, na coleta de informações invadindo as comunicações eletrônicas ao redor do mundo. Tratava-se do Projeto Echelon, em associação com o Reino Unido, Irlanda, Austrália, Canadá e Alemanha.

Do episódio em si, a constatação de nossas fragilidades para contrapor a interferência externa que atenta contra nossa soberania, incluindo o que a Marinha do Brasil chama de Amazônia Azul, na verdade, um verdadeiro território submerso de riquezas biológicas e minerais. Entretanto, a única instituição com competência legal para neutralizar a inteligência adversa, é a Agência Brasileira de Inteligência (Abin), que como a Polícia Federal, também carece de melhores condições de trabalho e carência de pessoal, de resto, como todo o serviço público.

Para os Estados Unidos e demais países, inclusive o nosso, a certeza de que o elo mais fraco na corrente da segurança continuo sendo o homem. Certamente que procedimentos para o recrutamento de operadores de inteligência deverão ser revistos e novos protocolos de acesso à informação deverão ser repensados. Esta história não acaba aqui, ela ainda vai longe...

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