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Illustration by Dean Rohrer |
Joseph S. Nye
CAMBRIDGE – Os Estados Unidos são uma nação de imigrantes. À excepção de um pequeno número de nativos americanos, todos são originários de algum outro lugar e mesmo os imigrantes recentes podem ascender a posições de liderança no domínio económico e político. O Presidente Franklin Roosevelt dirigiu-se certa vez às Filhas da Revolução Americana - um grupo que se orgulhava da chegada pioneira dos seus antecessores - numa expressão que ficaria famosa: “companheiras imigrantes”.
Nos
últimos anos, no entanto, a política dos EUA assumiu um forte cunho
anti-imigração e esta questão teve um papel importante na disputa da
nomeação presidencial do Partido Republicano em 2012. Mas a reeleição de
Barack Obama foi demonstrativa do poder eleitoral dos eleitores
latinos, que rejeitaram o candidato presidencial republicano Mitt Romney
por uma maioria de 3-1, tal como o fizeram os asiático-americanos.
Como
resultado, vários políticos republicanos proeminentes apelam agora ao
partido para que reconsidere as suas políticas anti-imigração, estando
os planos para a reforma da imigração incluídos na agenda do início do
segundo mandato de Obama. O sucesso da reforma constituirá um passo
importante na prevenção do declínio do poder americano.
Não
são recentes os receios relativos ao impacto da imigração nos valores
nacionais e na coerência do sentimento de identidade americana. O
movimento "Know Nothing" (Nada Sei) constituído no século XIX teve por
base a oposição aos imigrantes, especialmente os irlandeses. Os chineses
foram alvo de exclusão a partir de 1882 e, com a promulgação da Lei relativa à imigração de 1924, com características mais restritivas, a imigração em geral diminuiu durante as quatro décadas seguintes.
Durante
o século XX, os EUA registaram a percentagem mais elevada de residentes
estrangeiros, totalizando 14,7%, em 1910. Um século mais tarde, de
acordo com os dados do censo realizado em 2010, 13% da população americana nasceu no estrangeiro.
Mas, apesar de ser uma nação de imigrantes, o número de americanos que
olha a imigração com desconfiança é superior ao número que lhe dedica um
sentimento de simpatia. Os resultados de diversas sondagens de opinião
mostram ou uma pluralidade ou uma maioria que privilegia a redução da
imigração. A recessão contribuiu para o aumento do número de pessoas que
partilhava desta opinião: em 2009, metade do público dos EUA era a
favor da redução da entrada de imigrantes, que se situava acima dos 39%
em 2008.
O número de
imigrantes e a sua origem originaram preocupações a respeito dos efeitos
da imigração na cultura americana. A representação que os demógrafos
fazem para 2050, apresenta um país em que os brancos não-hispânicos
constituirão apenas uma ligeira maioria. Os cidadãos hispânicos
representarão 25% da população, sendo a percentagem de cidadãos
afroamericanos e asiático-americanos de 14% e 8%, respectivamente.
Mas
a comunicação de massas e as forças de mercado criam incentivos
poderosos para o domínio da língua inglesa e para a aceitação de um
certo grau de assimilação. Os órgãos de comunicação social modernos
ajudam os novos imigrantes a terem algum conhecimento prévio do seu novo
país, o que não acontecia com os imigrantes de há um século. Na
verdade, a maioria das evidências sugere que o processo de assimilação
dos últimos imigrantes decorre, no mínimo, com a mesma rapidez dos seus
antecessores.
Embora uma
taxa de imigração muito rápida possa causar problemas sociais, a longo
prazo, a imigração fortalece o poder dos EUA. Estima-se que,
actualmente, pelo menos 83 países e territórios apresentem taxas de
fertilidade que estão abaixo do nível necessário para manter a sua
população constante. Apesar dos países mais desenvolvidos se verem
confrontados com uma escassez de pessoas com o avanço do século, a
América é um dos poucos países que poderá evitar o declínio demográfico e
manter a sua quota de população mundial.
Por
exemplo, para manter sua população actual, o Japão teria de aceitar a
entrada de 350.000 novos imigrantes por ano durante os próximos 50 anos,
o que é difícil para uma cultura que tem sido tradicionalmente hostil à
imigração. Em contraste, a Divisão do Censo norte-americana prevê um
crescimento da população dos EUA de 49% para as próximas quatro décadas.
Actualmente,
os EUA são o terceiro país mais populoso do mundo, sendo provável que
daqui a 50 anos ainda mantenha esta posição (precedido apenas pela China
e pela Índia). Este facto é altamente relevante para o poder económico:
embora quase todos os outros países desenvolvidos tenham de vir a
enfrentar um encargo crescente para garantir o sustento da geração mais
velha, a imigração poderá ajudar a atenuar o problema desta política nos
EUA.
Além disso, embora
os estudos indiquem que os benefícios económicos a curto prazo da
imigração são relativamente pequenos e que os trabalhadores não
qualificados podem ser vítimas da concorrência, os imigrantes
qualificados podem ser importantes para sectores específicos - e para o
crescimento a longo prazo. Há uma forte correlação entre o número de
vistos para os candidatos qualificados e a área das patentes nos EUA. No
início deste século, um quarto das empresas de tecnologia de Silicon
Valley eram geridas por engenheiros nascidos na China e na Índia. Estas
empresas foram responsáveis por 17,8 mil milhões de dólares americanos
em vendas e, em 2005, os imigrantes tinham ajudado a iniciar um quarto
de todas as novas empresas de tecnologia dos EUA durante a
década anterior. Os imigrantes ou os filhos de imigrantes criaram cerca
de 40% das empresas da Fortune 500 de 2010.
Os
benefícios da imigração são igualmente importantes para o poder brando
da América. O facto das pessoas querem ir para os EUA aumenta a sua
atractividade e a mobilidade ascendente dos imigrantes constitui um
elemento atractivo para as pessoas de outros países. Os EUA são um íman e
muitas pessoas podem considerar-se norte-americanas, em parte porque se
parecem com tantos americanos de sucesso. Além disso, as ligações entre
os imigrantes e as suas famílias e amigos que estão no país de origem
ajudam a transmitir informações precisas e positivas sobre os EUA.
Da
mesma forma, dado que a presença de muitas culturas dá origem a vias de
ligação com outros países, constitui um contributo para ampliar as
atitudes e pontos de vista dos americanos em relação ao mundo, numa era
de globalização. Em vez de diluir os poderes duro e brando, a imigração
aumenta ambos.
O antigo
líder de Singapura, Lee Kwan Yew, um astuto observador tanto dos EUA
como da China, argumenta que a China não irá superar os EUA como
principal potência do século XXI, precisamente porque os EUA atraem os
melhores e mais brilhantes indivíduos do resto do mundo, moldando-os a
uma cultura variada de criatividade. A China tem uma população maior
para recrutar internamente, mas, na opinião de Lee, a sua cultura
sino-centrada irá tornar o país menos criativo do que os EUA.
Os
americanos deveriam levar a sério esta perspectiva. Se Obama conseguir
promulgar a reforma da imigração no seu segundo mandato, terá percorrido
um longo caminho no sentido de cumprir a sua promessa de manter a força
dos EUA.
--
JOSEPH S. NYE Jr. é professor emérito e ex-reitor da Kennedy School of Government da Universidade Harvard. De 1977 a 1979 atuou como subsecretário de Estado interino para Assistência à Segurança, Ciência e Tecnologia dos Estados Unidos e foi presidente do Grupo de Conselho de Segurança Nacional para a Não Proliferação de Armas Nucleares. Entre 1993 e 1994, presidiu o Conselho Nacional de Inteligência e, entre 1994 e 1995, atuou como secretário assistente de defesa para Assuntos de Segurança Internacional.
Tradução: Teresa Bettencourt
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